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Quem sabe lidar com o silêncio Faz dele uma casa Quem não sabe Faz dele um fantasma
Quem sabe lidar com o canto Faz dele uma relíquia Quem não sabe Faz dele uma súplica
Quem sabe chorar ao pé de um violão Faz dele um eterno amigo Quem não sabe Faz dele um ríspido sofrido
Quem sabe lidar com o coração Faz dele um eterno cúmplice Quem não sabe Faz dele uma enferma oração
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Poeta
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O sono é leve Criança de peito afável Leve contigo A vela desse náufrago
Pois, minhas dianteiras Sobraram todas na praia Choraram frente ao inimigo E ali mesmo afundou
No dia da mais alta glória Num riso lastimo de esperança De saber tudo sobre o mar E sob o mar nada poder
Aflige quem está de expectador Supera todos que olham dispersos E lá do alto suplicam Pela volta de sentir a dor novamente
Da voz que soa rouca No som de uma respiração O coração se faz valer Da própria ânsia de bater
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Poeta
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Quero me perder no calendário romano, humano ou beltrano, afinal, tempo é partido e dele me tomo posse e me escravizo; deitado lê seus dias que agonia, que agonia.
Quero me perder não, não quero dar com os burros n’água, ficar com a cara extasiada como criança mimada; quero perder o tempo, desprender a palavra mais alta, aliviar minhas lentes mundanas.
Meus cálculos de perda temporal, que anunciam temporais e que na janela nem passarinho canta, no máximo uma mariposa chega na planta, que estendi em meu quarto azul, que afundei nos teus negros olhos, que olharam, olharam e molharam.
Todo meu chão manchado de tinta, meu pé arranhado pelo asfalto, meus sonhos atravessados, nas nuvens, nos universos inteiros, de todos os irmãos que enxergo, deitados na chuva, esperando a sorte alcançá-los esperando...
E nada posso lhes acometer, senão sou punido por quem me habita ou quem sabe, é só um canto que tomou forma num corpo qualquer e que trabalha em forma de poesia; é recíproco, é leve, é levitante, é um muro feito com areias claras, mas e o mar que é o mar não as alcança.
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Poeta
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O poeta quando descobre sua impotência escreve centenas de versos enxugados - Preciso sempre de uma caneta ao meu lado.
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Poeta
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Antes era um livro fechado, Um telefone desligado Agora é vento na árvore Varrendo toda a ilusão Dos olhos acostumados.
É poema perdido, Lançado ao mar Como a tarrafa Que vai sem saber, Que recolhe o ouro do mar.
Preocupação não há Os peixes hão de vir Caminham cegos Ao seu destino quiçá Que não sabem.
E cumprem seu papel, Como os papéis do livro fechado, Na ânsia de serem lidos e entendidos, Nem que seja por uma tarrafa Lançada sem saber.
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Poeta
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O violão transmite o som das árvores a folha transmite a poesia das árvores a poesia transmite o vento do pensamento que as árvores sentem e desfolham em segredos o pensamento, a árvore, o vento e a poesia que são e serão eternos cúmplices.
Poesia e música são instrumentos divinos no qual percebemos que realmente sentimos uma lira, um olhar por todos nós que abraça, que sonha, que nos larga e volta Vê se está tudo bem por aqui se a casa nos ofertada virou um sítio ou um hospício com belas flores ou pavorosos loucos que entretêm nossos olhos com simples sonhos mas que são breves e poucos.
Terra dos que já se cansaram da voz dos que esperam meticulosamente a sua vez dos que sabem do tempo e por isso choram ao lembrar que os mesmos olhos que choram um dia, não terão mais olhos, não terão mais choro e a vela dessa ilusão será desfeita pelo tempo ao mesmo tempo em que uma flor nascerá na alta montanha, no sombrio relento desmentindo a própria lei de ter braços e querer voar.
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Poeta
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Minha 1ª namorada, eu escrevia poemas e levava tapa na cara Minha 2ª namorada, eu escrevia poemas e levava tapa na cara Minha 3ª namorada, eu escrevia poemas e levava tapa na cara Hoje em dia eu dou tapa na cara e recebo poemas.
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Poeta
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Prá quem quer água, sobra mar Prá quem quer ar, sobra vento Prá quem quer fogo, sobra sol Prá quem quer terra, sobra chão Prá quer quem tenha sido, digo não! Disse não, eu? Digo, coração Que sobra, que terrena, que aguara, que ventania, que fogaréu.
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Poeta
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Aí eu a encontrei às 3h da manhã, no bar. Já estava em flutuante pensar. Passei direto, pedi uma cachaça. Desceu gritando. Olhei para o lado e ela me disse: - Não gosto de poetas.
Respondi que eu não gosto de putas! Fechou a cara e indagou: - Quem disse que sou puta?
Franzi a testa e respondi: - Quem disse que sou poeta?
- Mas é o que todos aqui dizem de você. - Já eu nunca ouvi falar nada sobre você. - Então como sabes que sou puta? - Justamente por nunca ter ouvido falar nada sobre você.
Puta da vida, ela grita: "VOCÊS, POETAS, SÃO LOUCOS". Puto da vida, murmuro: "E você só não é mais puta, pois não cobra.
- Se puta sou, Deus é meu cafetão! - Se poeta sou, Deus é meu porta-voz! E com minhas putas palavras, gozo nas línguas portuguesas, dou cambalhotas em fins de tarde, faço orgias com versos e sílabas, alço a bandeira que bem entender e me calo. E tu, puta, o que fazes?
- Faço orgias com portugueses, gozo em línguas ásperas e dou cambalhotas nas madrugadas, parte de mim fica em cada quarto, alço a bandeira vermelha e me calo.
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Poeta
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Ai, quem me dera... um flagrante de poesia. Ai, quem me dera, ter todo dia...
Um flagrante de todo dia, ai quem me dera, ter poesia.
Então eu veria que toda alegria vem na angústia de mais um dia.
Na minha folia você se fazia montada na poeira de mais um dia.
Guria, guria, que na rua sumia e na praia morria. Guria, guria.
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Poeta
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