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Enterrei as minhas recordações Num canteiro do meu jardim, Os desgostos e as ambições E cobri tudo com jasmim.
Assim ficarão perfumadas Do que foi a minha vida Feita de amores e pecados Nasci com a minha sina lida.
Ao redor desse canteiro Plantei os meus amores, Uma cruz e um letreiro... Aqui jazem as minhas dores.
Bem à vista dos visitantes Escrito também estão ali As mais belas variantes Dos erros que cometi.
Por vezes tenho saudades Outras vezes sinto repúdio Entre desgosto e felicidade Da vida vivida no prelúdio.
Pois que não se pode viver hoje Uma vida que é de amanhã Assim a mocidade nos foge De uma maneira nada sã.
A. da fonseca
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Poeta
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Para onde vais criança? Caminhas em estrada sinuosa Numa caminhada perigosa Tentando dar rumo à vida. Eu sei, eu sei que tu procuras A felicidade que outros têm Mas para ti ela não vem E porquê? Todos temos direito ao Sol Todos temos direito à educação E temos também o direito à indignação!. Não te deixes abater Não te deixes cair num abismo Donde dificilmente sairás. Para de parar nessa estrada da vida Procura outra, a que te é devida. Levanta a cabeça, mostra a tua dignidade Caminha de peito aberto Grita, grita, reclama Que queres uma estrada sem lama Que queres viver a vida com amor Sem miséria e com pudor.
A. da fonseca
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Poeta
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Ter ou não ter, eis a questão. Ter alma ter vida ter coração. Ter sensibilidade, saber amar, Ter uma vida sã, não perder a razão
Ter ou não ter, eis a questão
Ter coragem para saber dizer não Ter coragem para uma causa defender Se ela é justa, mesmo se se queimar Ter amor pelo próximo sem se conter
Ter ou não ter é uma questão de querer
A. da fonseca
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Poeta
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Ando perdido na sombra da tua sombra. Procuro te encontrar e não consigo. Tu foges de mim como uma tímida pomba Como se eu fosse para ti um grande perigo.
Ando perdido porque me negas o teu amor. Vagueio nas ruas sem saber para onde ir. Na tua singela rua só encontro dissabor, O meu coração anda triste, não pode rir.
Ele sente fortemente o desprezo por ti dado. Ele que te ama e que só amor te quer dar, Mas sabe que não pertence ao teu reinado.
E de desgosto o meu peito ficou inundado Com mil e uma lágrima choradas de saudade De um coração que de ti se sente abandonado.
A. da fonseca
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Poeta
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Sou um velho carro, sou de colecção. Com os pneus já muito gastos E já nem têm hipóteses de reparação. Os amortecedores a guinchar com o peso Desta velha carroçaria toda ferrugenta E já nem sei como ela ainda aguenta. O delco e a distribuição lá vão, lá vão; O motor para trabalhar, à manivela com a mão. O depósito da gasolina cheio de remendos, Com pastilhas especiais ainda resiste. O carburador trabalha mas aos solavancos Distribuindo com dificuldade o carburante. Os gases lá vão saindo pelo tubo de escape Mas a explosão é fraquinha, não como dantes. O radiador vai sofrendo de incontinência; Para o motor não aquecer, pois que perde água, Para chegar ao destino rolo com paciência
A. da fonseca
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Poeta
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Estou cansado da vida, estou cansado de padecer. Comecei a sofrer à nascença e continuei a sofrer. Já não quero já não posso assim contigo continuar Mas não te darei o prazer de um dia me matar.
Vou fazendo resistência reforçando o meu moral. Não contes com a minha ausência, só se for casual. Vou sofrendo, vou vivendo, quero continuar a rir. Não quero que outros sofram se não souber resistir.
Morte que nasceste comigo comigo hás-de morrer. Não conseguirás resistir também te farei sofrer. Morrerás com a mesma idade aquela que eu terei.
Depois eu quero ver se tu ficarás contente, Sabendo que as tuas irmãs fizeram morrer tanta gente. Mas eu te levarei comigo e comigo te enterrarei
A. da fonseca
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Poeta
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Eu te via passar na minha rua E o meu coração ficava suspenso Ao teu andar gracioso de catraia, À fricção suave da tua saia, O sentir du perfume que ainda me fascina, Aos teus passos sincronizados de dançarina.
À tarde, quando eu te via chegar O Sol dava esplendor ao teu rosto. Tu te fazias discreta desviavas o olhar. Mas fascinado pela graça do teu andar Eu queria ter a deliciosa certeza De um dia conquistar tanta beleza.
Passas-te e pela primeira vez Teus lábios se abriram num belo sorrir. Senti a euforia da paixão, Esse momento mergulhou o meu coração Numa nuvem de sonhos apaixonados E de esperança de amor conquistado.
A realidade substituiu os sonhos. Nossos corações e nossos lábios se uniram. O nosso amor é forte e exaltante, Tudo é belo tudo é luz tudo é excitante. Temos uma vida de amor juncada. Vivemos felizes, vivemos um conto de Fada.
A. da fonseca
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Poeta
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Vejo as horas que passam Os dias que se vão E a esperança que se perde. Os anos que se entrelaçam Formando tranças de ilusão E a vida já não é verde.
Vi os anos que passaram Vejo aqueles que vão passando Talvez veja os que vão passar. Ouvi as canções que se cantaram Oiço as que se vão cantando Amanhã... não sei se oiço cantar.
A. da fonseca
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Poeta
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Já tenho saudades de ver os teus olhos, De os teus lábios beijar, de te falar de amor E como um senhor, com vénia te amar. Lembro o silencio desses loucos momentos Em que estávamos sós, só os olhos sorriam, Nossos corpos se uniam, perdíamos a voz. Volta e eu te ofertarei cataratas de amor, Montanhas de flores ornadas de estrelas. Te darei também as noites mais belas, Te cobrirei de beijos serei teus desejos E para a vida inteira serás minha Cinderela.
As noites são longas não tenho mais sonhos. São noites sem estrelas, vagueio e não há Luar Nem ter teus lábios para os meus poder adoçar Nem sequer romantismo à luz de uma vela. Canto, canto o amor para que possa ouvir No meu desespero o meu coração chorar Mas pensando em ti ele chora de mansinho Passando a minha porta, ele não te irá assustar.
A. da fonseca
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Poeta
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Viver numa utopia a léguas da realidade Como alguns têm sempre feito neste vazio. Vazio de ideias, de certezas mas de vaidade Sempre de cabeça quente mas de coração frio.
Vivem julgando que a glória está mesmo ali Na estação de São Bento ou na do Rossio, Acabadas de chegar do infinito que lhes sorri Mas não esperem muito, morrerão de frio.
A glória só vem com a inteligência e a humildade. Ela não nos cai nos braços sem se ter trabalho, Por isso há os grandes e pequenos, é a verdade E estes não pedem glória mas nas letras, agasalho.
Não é doença nem é vicio não se ser inteligente Mas quantos inteligentes se julgam superiores Somente porque o destino lhes deu essa nascente De onde as ideias brotam, como brotam as flores.
Não podemos esquecer que as flores murcham. As ideias e a inteligência murcham pouco a pouco, Como as flores, deixam cair as mais belaS pétalas Acabam por morrer sem gloria, por vezes loucos.
A. da fonseca
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Poeta
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