|
Noite de Baile
A cena se passa na Holanda, em 1919.
Cena Única
Uma sala bem mobiliada com duas portas laterais e uma na frente. A porta da frente leva a um quarto. Em cena há dois homens. Um chamado Florian e outro Frederik. Eles estão impaciente e olham para os próprios relógios.
Florian- Estamos aqui há quase meia hora. Minha irmã, mãe e sua esposa simplesmente não conseguem se decidir o que vestir para o baile.
Frederik- Não preciso nem dizer que isto é a mania mais feminina de todas, não?
Florian- Mesmo assim, deste jeito chegaremos atrasados ao baile.
Frederik- Não vejo problema nisso. Seria até bom para nós.
Florian- Para horários sou como os ingleses, detesto atrasos. Mas creio que daqui a cinco minutos elas saem do quarto.
Frederik- Ou não. Mas me diga, Florian, você está mesmo empolgado para ir a este baile?
Florian- Nenhum pouco, meu caro. Estou indo por causa de minhas irmãs e mãe. Mas gostaria de ficar em casa esta noite.
Frederik- E tem mais um baile semana que vem que teremos que ir.
Florian- Farei de tudo para escapar desse. Nem que eu comece a jogar e fumar com os amigos.
Frederik- Já faço isso, mas se eu não ir, sabe o que acontece, não?
Florian- Você poderia realmente escapulir por algumas horas, mas acho que por causa dessa ansiedade delas será muito difícil.
Frederik- Há dias estou ouvindo de minha mulher sobre este baile. Sabe como detesto ouvir a mesma coisa mais de uma vez, não sabe?
Florian- Oh, sei, e nisso sou igual a ti. Mas elas estão empolgadas e elas idealizam os bailes. Você deveria saber disso.
Frederik- Sei, e já fui a dezenas de bailes sabendo disso, e parece que não consigo pensar em nada para me livrar deles.
Florian- Ainda bem que são apenas os bailes. Um amigo meu tem uma mãe que tem... Bom, digamos que ela tem o que eu chamo de doença social. Ele tem que acompanhá-la a casamentos, velórios, batismos, piqueniques, óperas, etc. Ele muitas vezes está até mais contrariado do que estamos aqui.
Frederik(decepcionado)- Pobre coitado, mas eu ainda hei de arranjar um jeito de me livrar de ir a lugares que não quero com minha esposa.
Florian- Se me permite ser sincero, poderá arranjar conflitos com tua mulher. Com minha mãe estou acostumado a ter certas rusgas, mas eu te aconselho a ir a esses lugares, ou então, torcer para que sua mulher se torne mais introspectiva e caseira.
Frederik- Impossível, meu caro Florian. Minha mulher também tem a tal da doença social. Ela não consegue passar uma semana sem ir a algum lugar.
Florian- Isso prova que ela mesmo com os conflitos da vida consegue superá-los na companhia das pessoas.
Frederik- Sim, é o que parece. Mas me diga, você realmente sai sempre com sua mãe e irmã? Porque parece que elas são vistas algumas vezes desacompanhadas.
Florian- Consigo fugir algumas vezes, mas é raro agora, principalmente porque minha mãe agora está mais empolgada com todo tipo de eventos.
Frederik- Imagino. Minha esposa também está assim.
Florian- Primavera também, você sabe como elas ficam alvoroçadas nesta estação.
Frederik- Sim, eu sei, elas...
Neste momento a porta se abre e três belas mulheres saem.
Saskia- E então meu caro filho Florian, como estou? (Ela dá duas voltas exibindo o vestido).
Florian- Belíssima mamãe. Nunca a vi tão bela como hoje.
Veerle- E quanto a mim, meu irmão? (Faz o mesmo que a mãe).
Florian- Tão bela quanto as flores de nosso país na mais dileta primavera.
Veerle sorri encantada.
Wilhelmina- Veja querido Frederik como estou bela também.
Frederik (sorri encantado) - Sim, minha linda. Nunca te vi tão bela. Estou muito orgulhoso de ti.
Saskia- Vamos logo, creio que estamos atrasadas. O carro já está pronto, Florian?
Florian- Sim, mamãe.
Veerle- Vamos, estou ansiosa por este baile. Creio que haverá boas surpresas.
Florian dá os dois braços. Sua mãe do lado direito segura o braço, e o mesmo faz sua irmã no esquerdo. Frederik acompanha sua mulher segurando-a pela cintura. Todos saem. Ouve-se um pequeno barulho de ventania pela casa, mas nada muito preocupante. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
A Morte do Velho Jardineiro
A cena se passa na Inglaterra, em 1942.
Cena Única
Uma casa velha com uma escada que vai levar a um corredor um pouco longo, e que também leva a um quarto que está com a porta ligeiramente aberta. Nela vemos uma luz saindo. Nela há três pessoas. Uma é um rapaz de aproximadamente vinte e dois anos, de cabelos negros e olhos verdes. Outro é um senhor de aproximadamente sessenta anos, e outro é um homem de quase quarenta anos, alto, loiro e de olhos castanhos. Os três bebem vinho.
Victor- Anton, já te dissemos que realmente precisamos daquela relíquia. Sem ela realmente não podemos continuar nossos planos.
Anton- Mas conseguí-la nos campos da Sociedade realmente não será fácil. Precisaremos usar outra pessoa.
Victor- Não usaremos outra pessoa, você irá lá e pegará a relíquia.
Anton- Você sabe que tenho outros trabalhos a fazer dentro da nossa organização.
O homem mais velho fala numa voz calma, mas fria.
Theodor- Se não achares uma pessoa adequada, você mesmo roubará a relíquia, meu caro Anton. Você sabe que estou muito fraco e não posso fazer isso.
Victor- Eu não vejo como prosseguir nesse estilo. Temos que nos esconder sempre, e não há muitas casas abandonadas hoje em dia que podemos usar.
Anton- Mas ainda há milhares de oportunidades, e as pessoas não são muito curiosas nesse estado. Ou seja, podemos ficar em cada casa quase um mês, até.
Victor- Precisamos realmente dessa relíquia logo. Nossos amigos de outros planos não estão muito pacientes para esperar, e eles precisam vir para esse plano logo, vocês sabem, a guerra continua nos dois planos, e o que acontece aqui...
Anton- Influencia no outro plano. Já sabemos disso, Victor. Mas a relíquia está fortemente guardada dentro da Sociedade. Você sabe, há mais de quatro camadas que conhecemos que protegem aquela relíquia.
Theodor- Mas iremos com certeza conseguir. Não vamos desanimar agora. Já estamos há quase dois anos mudando de um lado para outro, o sucesso realmente será nosso.
Anton- Precisamos contatar os outros. Como faremos?
Theodor- Como sempre fizemos, Anton. Você anda se esquecendo demais dos velhos modos. Mas só vamos fazer isso daqui a uma semana. Por ora teremos que tomar cuidado com esse lugar.
Victor- Tem certeza que aqui não havia nenhuma pessoa?
Anton- Pelo que andei vendo, não, mas aqui é uma área onde as casas estão sempre fechadas. Os vizinhos nesta região são mais caseiros, então é impossível saber de tudo.
Victor- Então ficaremos aqui uns quinze dias, apenas.
Theodor- Ou menos. Já que não sabemos se realmente há alguém aqui que pode ouvir nossos planos.
Victor- Mas creio que podemos cuidar de algo agora mesmo.( Victor pega em um canto um frasco de veneno, uma taça e uma garrafa de vinho. Ele coloca veneno na taça junto ao vinho e coloca a taça em cima de uma mesinha).
Theodor- Então, como nós iremos...
Ouvimos de fora os passos de um homem. É o velho jardineiro que cuida da casa. Ele é um senhor de uns setenta anos, e vai se aproximando do corredor. Ele ouviu uma parte da conversa pois já estava na casa.
Victor- Temo que fiz bem em colocar vinho na taça. Um homem está lá fora. Terei que...
Theodor( autoritário)- Faça logo.
Victor sai do quarto com o copo de vinho com veneno nas mãos. Ele encontra o jardineiro perto dele.
Jardineiro- Ouvi grande parte de vossa conversa. Saiba que estou pronto para chamar a polícia por você estarem planejando roubar uma relíquia.
Victor( sorridente)- Que isso, meu senhor. Somos atores. Estamos apenas ensaiando uma peça.
Jardineiro- Não me venha com essa, eu sei muito bem que são bandidos e pretendo pará-los.
Victor- Não somos bandidos, veja, fizemos mal em invadir a casa, realmente, mas estamos sem dinheiro para nos acomodarmos. Estamos ensaiando e vamos embora. Prometemos nunca mais voltar.
Jardineiro- Então realmente não são bandidos?
Victor- Claro que não, senhor, e para provar. Vou te ofertar um belo copo de vinho. Que bandido faria isso?
Jardineiro- Está bem( Inocentemente estica a mão para pegar o copo de vinho, Victor o entrega com um olhar inocente. Ele bebe todo o vinho na taça, sorri, e dentro de dois ou três minutos começa a passar mal e se joga no chão e morre rapidamente).
Victor vai até o corpo, leva-o até o quarto.
Victor- Ainda bem que ele foi deixando as defesas logo de lado.
Theodor- Enterre-o no quintal. Ficarei aqui vigiando se vem mais alguém.
Victor- Sim, meu senhor.
Victor pega o corpo de jardineiro, sai do quarto e atravessa todo o palco com o corpo na mão e sai pela esquerda. Ouvimos corvos lá fora. Uma porta bate.
Theodor- E assim mais um acaba morrendo por se intrometer em negócios alheios.
Ele olha para Anton que sorri. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
Jogos Estranhos
A cena se passa na Áustria, 1899.
Cena Única
Uma sala contendo muitos objetos, de quase todos os tipos, mas alguns arrumados, e outros desarrumados. Um homem chamado Gerwin Ziegler está em cena. Ele está diante de três manequins e tem nas mãos alguns morangos. Ele vai morder um, mas muda de ideia e joga nos manequins. Ele fica pouco satisfeito, suspira. Ele pega uma espingarda. Ele fica mexendo nela de cima a baixo e depois lança-a dando um pulo. A espingarda cai quase do outro lado da sala. Ele pega uns dois livros e coloca-os em cima de uma mesa em pé. Ele começa a tentar acertá-los com um copo de água, e coloca o copo de lado. Depois ele pega duas bolinhas de gude. Ele coloca as bolinhas no chão e começa a jogá-la perto de um manequim bonito. Depois ele pega dois copos de plástico, ele coloca um no outro e coloca na cabeça e começa a andar com eles tentando se equilibrar como se faz com um livro na cabeça. Ele joga os copos de lado, e senta-se numa poltrona e fica mexendo os pés para cima com certa velocidade e força. Ele se levanta e fica a rodopiar e falar aaaaaa e eeeeeeee umas quinze vezes. Depois ele se cansa e pega um álbum de fotos e fica folheando- o com força e joga-o de lado. Ele depois vai até um prato de biscoitos e começa a lambê-los, pára de lamber e coloca o prato debaixo de um livro. Ele suspira, dá três pulos grandes e duas cambalhotas. Ele então pega duas cartas de baralho e fica passando o dedo nelas, e depois ele grita com elas. Depois de dois minutos, ele se cansa. Ele então pega um colar e fica fazendo dele um ioiô, ele coloca o colar numa caixa de madeira e fica segurando a caixa, coloca no chão, coloca-a de volta e a mesma coisa umas sete vezes. Depois de tudo isso, ele simplesmente para de mexer nas coisas e volta a poltrona. Ele então fecha os olhos. Ouvimos uma voz em off:
Voz- Jogos estranhos! Jogos estranhos sendo jogados na casa 22. Vamos ver os jogos estranhos!
O homem se levanta rapidamente. Ele sai de cena.
Voz- Mostre-nos os jogos estranhos! Mostre-nos os jogos estranhos.
Um barulho de porta ouve-se bater. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
Weltschmerz
A cena se passa na Inglaterra, 1932.
Cena Única
Um quarto em uma casa. Vemos um rapaz deitado na cama. Ele está totalmente abatido, depressivo. Ele se chama Richard Holling. Ao seu lado está a sua mãe, Stephanie Holling. Ela segura a mão dele com carinho.
Stephanie- Ri, você precisa levantar dessa cama. Faz três dias que você não levanta.
Richard(melancólico)- Não tenho nenhuma vontade, e afinal, você sabe o quanto estou decepcionado com tudo a minha volta.
Stephanie- Sim, eu sei, e já te avisei para você tentar controlar esse seu desânimo, meu querido.
Richard- Como posso controlar se é maior do que as minhas forças? Maior que as minhas emoções? Simplesmente eu não consigo entender como as pessoas raramente ficam tristes com o mundo que elas vivem e tem diante de si o tempo todo.
Stephanie- Fazemos o possível com o que temos, mas claro que muitas acabam realmente vivendo mais esse caos e essa desarmonia do mundo. Ou acabam absorvendo.
Richard- Sim, e é isso que me deixa cada vez mais desanimado, melancólico e sem ação. Eu simplesmente creio que eu deveria viver em um mundo melhor, onde eu realmente visse todos os meus sonhos, ideais e aspirações completamente realizados.
Stephanie- Você ainda viverá isso, meu querido, mas para isso precisamos visualizá-lo e fazer esse mundo a cada segundo.
Richard- Você sabe o quanto eu visualizo. Visualização não é problema para mim.
Stephanie- Não, meu querido, mas parece que viver sempre seus ideais fortemente e não vê-los realizados à sua volta, é.
Richard- Minha mãe, você sabe o quanto eu realmente gostaria de não ter tantos ideais elevados. Você sabe que eu gostaria de não ter que passar por isso, mas é extremamente forte, e eu não posso fingir até este ponto.
Stephanie- Mas pode realmente se levantar e continuar com seus ideais, e até mesmo colocá-los em prática passo a passo.
Richard- Como? Muitas vezes eu não consigo verbalizar o que realmente sinto, apesar que isso está mudando, e é muito bom.
Stephanie- Você precisa realmente ser mais forte.
Richard(glacial)- Eu gostaria de ficar sozinho.
Stephanie levanta-se sem olhar para ele e sai rapidamente e suspira.
Richard- Como essas pessoas são tolas e não compreendem nem o básico da emoção humana. Por que tentam ajudar se não conseguem compreender? Por que em tudo que eles tocam apenas sai seus preconceitos, ideias tolas e idiotas para fora? Eu não consigo compreender um mundo que realmente não consegue tornar a empatia como a primeira e talvez a única forma de realmente compreender o mundo. Por que...
Entra um menino de uns oito anos em cena. Ele se chama Christian. É o irmão de Richard.
Christian- Ri, mamãe me contou que você não sai um tempo. Por que não conversamos lá fora e brincamos um pouco?
Richard (suspira contrariado) - Não, Chris. Mas pode ficar um pouco aqui e conversamos.
Christian- Bom, é que... Eu não...
Richard(glacial)- Pode sair, Christian.
Christian olha para ele, balança a cabeça negativamente e sai batendo os pés.
Richard (levanta-se e dá alguns passos perto da cama) - Pestinha. Como se eu não soubesse que ele quer que eu o leve para os lugares que ele gosta de ir. Ah, eu não sei mais o que faço. Tem três dias que não para de entrar e sair gente daqui. Quatorze pessoas entraram aqui em três dias. Eu simplesmente vou me trancar totalmente.
Stephanie entra novamente em cena. Ela tem um ar grave.
Stephanie- Chris me disse que você o maltratou. O que aconteceu?
Richard- Ele veio aqui simplesmente para me pedir para sair com ele. Não gostei e o mandei embora.
Stephanie- Ele veio apenas para brincar com você. Você ê poderia ter sido mais educado com ele, Ri.
Richard- Não o suporto. Você sabe disso.
Stephanie (suspira longamente) - Depois conversamos. Vou te deixar por um momento. Você precisa realmente ficar sozinho. (Ela sai).
Richard (suspira, deixa-se deitar na cama, fica olhando para o teto) - Eu realmente vou escrever um pouco. Não estou mais aguentando. Mas vou um pouco para o terraço. Eu não aguento mais as pessoas entrando aqui. (Sai).
Chris(off)- Mamãe, não posso mesmo ver mais uma vez o Ri?
Stephanie(0ff) - Não, seu irmão está passando por uma Weltschmerz.
Chris(off)- O que é isso?
Stephanie(off)- Eu te explico mais tarde. Pode ir brincar agora.
O pano desce. Fim.
|
Poeta
|
|
O Testamento de Heiligenstadt
A cena se passa em Heiligenstadt, em 1802.
Cena Única
Vemos um homem de trinta anos. Ele está sentado atrás de uma escrivaninha. Em cima da escrivaninha há uma pistola carregada. Este homem é o famoso compositor alemão Ludwig van Beethoven(1770-1827).
Ludwig( escrevendo e sempre ditando o que escreve)-
Por vezes, quis colocar-me acima de tudo, mas fui então duramente repelido, ao renovar a triste experiência da minha surdez!
Como confessar esse defeito de um sentido que devia ser, em mim, mais perfeito que nos outros, de um sentido que, em tempos atrás, foi tão perfeito como poucos homens dedicados à mesma arte possuíam! Não me era contudo possível dizer aos homens: “Falai mais alto, gritai, pois eu estou surdo”. Perdoai-me se me vedes afastar-me de vós! Minha desgraça é duplamente penosa, pois além do mais faz com que eu seja mal julgado. Para mim, já não há encanto na reunião dos homens, nem nas palestras elevadas, nem nos desabafos íntimos. Só a mais estrita necessidade me arrasta à sociedade. Devo viver como um exilado. Se me acerco de um grupo, sinto-me preso de uma pungente angústia, pelo receio que descubram meu triste estado. E assim vivi este meio ano em que passei no campo. Mas que humilhação quando ao meu lado alguém percebia o som longínquo de uma flauta e eu nada ouvia! Ou escutava o canto de um pastor e eu nada escutava!
Esses incidentes levaram-me quase ao desespero e pouco faltou para que, por minhas próprias mãos, eu pusesse fim à minha existência. Só a arte me amparou! Pareceu-me impossível deixar o mundo antes de haver produzido tudo o que eu sentia me haver sido confiado, e assim prolonguei esta vida infeliz. Paciência é só o que aspiro até que as parcas inclementes cortem o fio de minha triste vida. Melhorarei, talvez, e talvez não! Mas terei coragem. Na minha idade, já obrigado a filosofar, não é fácil, e mais penoso ainda se torna para o artista. Meu Deus, sobre mim deita o Teu olhar! Ó homens! Se vos cair isto um dia debaixo dos olhos, vereis que me julgaste mal! O infeliz consola-se quando encontra uma desgraça igual à sua. Tudo fiz para merecer um lugar entre os artistas e entre os homens de bem.
Peço-vos, meus irmãos assim que eu fechar os olhos, se o professor Schmidt ainda for vivo, fazer-lhe em meu nome o pedido de descrever a minha moléstia e juntai a isto que aqui escrevo para que o mundo, depois de minha morte, se reconcilie comigo. Declaro-vos ambos herdeiros de minha pequena fortuna. Reparti-a honestamente e ajudai-vos um ao outro. O que contra mim fizestes, há muito, bem sabeis, já vos perdoei. A ti, Karl, agradeço as provas que me deste ultimamente. Meu desejo é que seja a tua vida menos dura que a minha. Recomendai a vossos filhos a virtude. Só ela poderá dar a felicidade, não o dinheiro, digo-vos por experiência própria. Só a virtude me levantou de minha miséria. Só a ela e à minha arte devo não ter terminado em suicídio os meus pobres dias. Adeus e conservai-me vossa amizade.
Beethoven vai continuar a escrever, mas ele se sente cansado. Ele larga a pena, pega o revólver e fica olhando uns três minutos para ele. Logo ele desiste, guarda a pistola em uma gaveta. Ouvimos barulhos de passos. Beethoven sai rapidamente de cena. Vemos seu irmão Karl entrar.
Karl- Beethoven? Beethoven? Já se esqueceu que íamos sair juntos hoje? (Suspira, vai até a mesa e olha por cima as coisas, ele não pega o papel, mas o vê de longe, mas fica pouco curioso em saber o que está escrito nele)- Tudo bem, saímos depois. Adeus, Beethoven!
Karl sai pela esquerda. Ouvimos a sonata Appassionata sendo tocada ao longe. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
O Navegante Perdido
A cena se passa nas costas gregas, 1913.
Cena Única
O exterior de um barco com o leme. Vemos um homem chamado Grigori Panatkos junto ao leme. Ele está cansado e abalado.
Grigori- Cáspite! Três dias que deveria estar em Samos, mas peguei a rota ao sul que estava no mapa e que mostrava um atalho, e agora estou cá perdido, e este maldito rádio que não funciona! O que farei?
Ele sai de perto do leme e vai até a esquerda. Ele olha como se estivesse querendo enxergar algo além do horizonte. Vira-se e vai para a direita e faz o mesmo.
Grigori- Nada de terra! Nada de nenhuma costa! O que posso fazer? O máximo de dias que posso aguentar nesse maldito barco é quinze dias! Ou menos, se tiver a sorte de afundar por causa de uma tempestade como a de ontem! E como os dias passam depressa no mar!( Ele volta ao leme e começa a dirigi-lo).
Ouvimos um barulho de mar ao longe, e também alguns barulhos de vida marítima. Grigori está tão distraído que não percebe os barulhos.
Grigori- Eu tinha absoluta certeza que tomando a rota que tomei iria chegar em Samos mais rápido. Por que não fiz a mesma rota de sempre? Por que quis pegar um atalho? ( Mexe duas vezes no leme, olha para frebte como se estivsse olhando para o mar). Droga! Eu realmente preciso achar esse caminho!
Sai de perto do leme e vai até o canto esquerdo e fica olhando para o horizonte. Ele olha para o horizonte mais ou menos uns dois minutos. Depois para, e volta ao leme. Ele se senta em um banquinho e fica desanimado. Passa a mão nos cabelos, suspira longamente.
Grigori- Não sei mais o que faço. Já tentei todas as rotas que ainda conheço. Agora realmente vou ter que operar no modo intuição, se é que realmente sei usá-la. Mas... Não, essas rotas nunca tem navios da marinha. Eles ficam mais a noroeste de onde estou.
Grigori vai até o leme novamente, guia-o por mais ou menos uns dois minutos. Solta. Ele novamente fica desesperado. Toma uns goles de água em uma garrafa. Fica sentado a olhar para a frente.
Grigori- Vou atracar. Não aguento mais. Não, não posso fazer isso. Preciso continuar a tentar achar o caminho.
Ele volta a pegar o leme, mas ele está tão abatido que decide parar de vez de pegar no leme.
Grigori- Vou realmente tirar uma soneca. Não quero continuar a seguir por hoje.
Grigori sai. Ouvimos um barulho de mar e algumas gaivotas. Ouvimos o barulho de vozes ao longe, mas logo o pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
Três gatos e um mordomo
A cena se passa na Bélgica, em 1895.
Cena Única
Uma rica sala decorada no estilo contemporâneo. Nela vemos uma senhora, de aproximadamente 60 anos, vestida elegantemente e usando um colar de pérolas. Ela está sentada em um sofá. Ao lado dela em outro sofá está um homem jovem, de cabelos negros e olhos verdes chamado Maurice. Ele é médico e está tomando uma xícara de café. Vemos um homem entrar. Ele se chama Ernst e é o mordomo da casa. Ele carrega três gatos chamados: Da Vinci, Mozart e Dante. Os gatos miam muito.
Gloria- Oh, meus gatinhos lindos Traga-os aqui, Ernst.
Ernst- Sim, madame.( Ele leva os gatos até ela que pulam em seu colo miando).
Gloria( abraçando os gatinhos)- Oh, eu não consigo viver sem vocês meus artistas lindos.
O médico olha para a cena e ri um pouco.
Ernst- Vou terminar de fazer os outros afazeres, madame.
Glória- Não tão rápido, Ernst. Quero que os alimente, e também quero que os vista com uns casaquinhos.
Ernst( expressão cansada)- Sim, madame.
Glória- Maurice, vamos deixar Ernst cuidar dos gatinhos e passear pelo jardim. Preciso falar de minha saúde que não está boa.
Maurice( larga a xícara)- Está bem. Vamos.
Os dois saem. O mordomo fica a sós com os gatinhos que aindam miam muito.
Ernst( cansado)- Alimentar mais uma vez estes gatos e ainda vestir casaco para eles, e claro, colocar um monte de tintas e papel na frente deles para que eles criem( Faz gestos de aspas) suas obras de arte. Ah, isso não é um trabalho! É um martírio!
Os gatinhos ficam pulando de um sofá para o outro. O mordomo olha para os gatos, ele suspira e sai. Ele volta com três tigelas com mingau e com casaquinhos de cor azul, verde e rosa. os gatinhos ficam miando e vão para as tigelas e ficam lambendo o mingau.
Ernst( deixa-se cair no sofá)- Malditos gatos! Como eu gostaria de matá-los! Vocês não fazem ideia do trabalho que me dão!
Os gatinhos continuam tomando o mingau.
Ernst- Eu poderia sufocar cada um com esses casaquinhos... Ou quem sabe colocá-los para dormir e mandá-los para algum lugar. Ninguém desconfiaria. Tenho amigos no correio que podem enviar para mim sem cobrar nada.
Os gatinhos continuam se fartando do mingau. Ernst se levanta e fica andando pela sala. Ele vai até a janela e fica olhando para fora. Logo ele volta para junto dos gatos que pararam de tomar o mingau. Ele pega os três casaquinhos, mas os gatinhos se afastam dele.
Ernst- Maldição! Por mil demônios! Toda vez que vou colocar os casaquinhos neles eles fogem! ( Fingindo docilidade)- Venham aqui, meus queridos e amados gatinhos. O titio apenas quer vestí-los com os casacos mais lindos do mundo!
Os gatinhos fogem mais uma vez. Ernst desiste. Ele volta a janela.
Ernst( olhando para a esquerda)- Oh, como as violetas e margaridas estão bonitas... Oh, mas o que vejo lá? Será que é...?( Ele se debruça na janela, escorrega e ouvimos um grito de Ernst caindo no chão. Depois não ouvimos mais nenhum grito).
Glória( off)- Então, doutor, como está minha saúde?
Maurice( off)- Boa, mas precisa continuar os exercícios.
Glória( off)- Adorei saber que minha saúde está boa. Daqui a pouco verei meus gatinhos lindos.
Vemos os gatinhos brincando por todo o canto. Eles miam bastante. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
A Lembrança
A cena se passa na Irlanda, em 1922.
Cena única
Uma sala com uma janela, uma cortina bege, uma estante com livros, uma porta à esquerda, um quadro na parede. Um lugar com um aspecto de ser um local de trabalho. Há um telefone em cima de uma mesa com alguns papéis e canetas. Um homem está sentado uns cinco metros em uma cadeira perto da escrivaninha, Ele se chama George. Está consternado, sua bastante e coloca as mãos nos bolsos toda hora.
George- Ah, Céus, eu preciso realmente me lembrar do que aconteceu naquele dia e como fui perder a senha. A senha, na verdade é a lembrança. Eu sei que ela está aqui. Eu a anotei, mas não lembro onde. E logo...( O telefone toca. George se levanta e atende o telefone)- Não, senhor, eu ainda não me lembrei.
Voz(-off)- Lembre-se logo, por todos os diabos, George! Precisamos realmente disso! Lembre-se logo.
George- Senhor, minha cabeça dói, eu estou suando bastante, e realmente não me vem nenhuma lembrança. Acredite em mim, eu realmente não me lembro!
Voz( off)- Pois trate de se lembrar. Você sabe que o contrato que está em mãos é muito importante!( Desliga o telefone).
George coloca o telefone no gancho, suspira, passa a mão no rosto desolado. Ele procura se lembrar mantendo um olhar distante, mas focado, mas não consegue nenhuma lembrança. Ele volta para a cadeira onde estava e se deixa cair nela exausto e sem esperanças. Ele fecha os olhos. Fade out.
Fade in. Vemos George completamente embriagado falando ao telefone. Ele está falando com sua mulher. Não ouvimos muito, mas ele está discutindo. Ele tem a voz embargada e chora profundamente. Ele desliga o telefone abruptamente. Ele dá alguns murros na mesa. Ele se levanta e dá alguns passos pelo escritório. Ele decide pegar uma garrafa de uísque e toma uns quatro copos seguidos. Logo ele lembra que precisa fazer algo. Ele vai cambaleando até a estante, pega um livro, tira uma caneta do bolso do paletó e anota alguns números na capa do livro. Ele guarda o livro. É o primeiro da direita à esquerda. Ele volta para a cadeira e fica bebendo. Ele canta baixinho, não ouvimos porque sua voz está absurdamente embargada. Ele se levanta da cadeira e vai até a janela e fica olhando para fora. Ele procura abrir a janela, mas não consegue por estar muito bêbado. Volta para a cadeira e deita nela, fecha os olhos e começa a dormir.
Fade out.
Fade in. George fica um pouco mais aliviado pois ele lembrou o que precisava. Ele vai até a estante e busca o livro, ele o acha depois de uns dois minutos. Ele vai até a capa, vê os números. Fecha o livro e o guarda no fundo da estante e vai até o quadro e retira-o. Há um cofre escondido. Ele começa a usar a combinação de números. O cofre se abre e George pega além de algum dinheiro, ele pega um contrato que está em um envelope marrom.
George- Finalmente lembrei. Não lembrasse eu estaria agora chorando desempregado e praticamente solteiro.
O telefone toca. George atende.
George- Senhor, acabei de achar o contrato da empresa do senhor Malvin. Eu estou levando agora.
Voz( off, nervosa)- Seja mais cuidadoso, George. Aposto que bebeu muito no dia e acabou se esquecendo! Venha logo, estarei te esperando! Não podemos perder esse cliente! ( Desliga)
George- Maldito velho. Espero que dentre dois anos eu esteja trabalhando em um lugar melhor e ganhando quatro ou cinco vezes mais!( Ele carrega o contrato com ele debaixo do braço. Ele o coloca em uma pasta. Coloca o chapéu).
George olha todo o ambiente arruma uma ou outra coisa que deixou fora de lugar, apaga as luzes e sai batendo a porta. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
A Inspiração de Tchaikovsky
A cena se passa em Moscou, nos idos de 1860.
Cena única
Quando a cortina abre vemos Tchaikovsky, um famoso compositor russo sentado diante de uma escrivaninha com papéis, uma caneta tinteiro. O lugar está mais ou menos escuro. É de noite. Tchaikovsky está frustrado porque está sem inspiração. Ele olha várias vezes para o papel pentagramado e não tem ideia nenhuma de como compor. Ele suspira longamente. Ele revira os papéis já escritos de alguns dias atrás. Ele se levanta e vai até uma poltrona, ele se senta e fica olhando para o vazio. Ele passa a mão na lapela do paletó, depois esfrega as mãos uma na outra. Passa-se cinco minutos e ouvimos em off um assovio. É o começo da Valsa Das Flores. Tchaikovsky levanta-se rapidamente, vai até a escrivaninha, puxa a cadeira e senta-se e começa a compor. O assovio em off vai até os dois minutos da Valsa das Flores assoviando. Tchaikovsky vai compondo cada nota que ele escuta. Depois dos dois minutos, se passa três minutos e ouvimos novamente a voz em off assoviando. Dessa vez até os quatro minutos da obra Valsa das Flores, Tchaikovsky anota rapidamente no papel. Ficamos cinco minutos em silêncio. E depois o gran finale começa a ser ouvido e Tchaikovsky termina de escrevê-lo. Ele esrtá radiante. Levanta-se com a partitura nas mãos muito feliz. Mas olha e vê que não tem título. Ele morde os lábios e fica pensando em um título.
Voz de mulher(off)- Sebastian, já plantaste as rosas brancas?
Sebastian(off)- Não, madame, ainda não tive tempo, mas logo irei fazê-lo.
Voz de mulher(off)- Pois faça logo. Eu não consigo viver sem minhas roseiras brancas.
Tchaikovsky tem um súbito de esclarecimento. Ele coloca os papéis com a valsa que foi criada ouvindo o jardineiro e coloca Valsa das Flores.
Tchaikovsky- Graças a Deus que recebi uma inspiração hoje. Oh, precioso Sebastian, eu ainda o agradecerei, mas não agora. Preciso dormir. (Tchaikovsky guarda os papéis em uma gaveta da escrivaninha)
Tchaikovsky olha tudo em volta e vai saindo assobiando a obra. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|
O Rádio e Eu
A cena se passa na Espanha, em 1931.
Cena Única
Um ateliê de pintura com todos os tipos de tintas, pincéis, quadros, e outros objetos artesanais. Há uma janela que está aberta. Há um perfume de lavanda no ar no ateliê. Do lado esquerdo vemos um quadro de um barco e uma parte do mar, ele está incompleto, mas é um belo, sensível e admirável quadro. Perto dele está uma mulher chamada Elisabeth. Ao lado do quadro, há um banquinho com um rádio ligado. O rádio está baixinho e quase não ouvimos o que está sendo tocado. Elisabeth está pintando, mas para por um minuto. Ela suspira cansada e coloca a paleta e o pincel de lado. Ela vai até uma parte do ateliê onde há uma mesa com papéis, revistas, e alguns jornais. Ela vê duas cartas e pega.
Elisabeth- Oh, que maldição! Diablo! O Alonso me escreveu novamente. Eu já pedi a prima dele para dizer a ele que não quero que me escreva mais. Que homen insistente! Como Yo sufro! Com ela não poderei parar de falar, mas irei diminuir o número da correspondência. Creio que ela nem falou com Alonso, ou ele anda cada vez mais teimoso mesmo. Se continuar, terei que dizer ao pai dele.
Ela se afasta da mesa e vai até outra onde há algumas frutas. Ela pega uma maçã, olha para ela, e desiste de comer. Na mesa há uma garrafa com água e um copo. Ela enche o copo de água e bebe todo. Coloca o copo de volta na mesa. Ainda ouvimos o rádio baixinho. Ela pega uma revista em outro lugar e começa a folhear. Ela folheia três páginas rapidamente, depois lê duas e fecha a revista, levanta-se e vai até outro lugar onde há tintas. Ela olha para cada tinta, escolhe as que irá usar novamente e anda mais um pouco pelo ateliê. Ela vai até uma porta, abre-a e entra. Ouvimos o barulho de água. Ela abre a porta e sai enxugando as mãos. Joga os papéis em uma cestinha e volta a pintura que estava fazendo. Ela passa o pincel na paleta e começa a dar pequenas pinceladas em um detalhe do barco na parte de trás. Ela é detalhista e faz tudo com muito cuidado. Depois de terminar o detalhe, ela passa para o céu que está ao centro no quadro e com o mesmo detalhismo ela vai pintando o contorno do sol, a intensidade dos raios, uma mera sombra, etc. Ela para mais uma vez. Ela vai até a janela e fica espiando para fora.
Elisabeth- Oh, como estou... Não cansada, mas exausta de estar sempre no mesmo mundo, ainda que todos os dias eu veja pessoas diferentes nesta janela. Claro, tudo se me parece sempre um pouco diferente, mas dentro de mim as coisas permanecem iguais. As sensações e percepções a olhar para fora não são as melhores. Oh, este mundo não passa de um ambulatório de corpos ambulantes e desprovido de Beleza e Harmonia! Um mundo que parece mais uma grande teia de aranha a nos prender todos... (Sai da janela e senta-se onde as tintas estão, fica um momento reflexiva).
Ela novamente vai até o quadro, coloca as mãos na altura da cintura, morde os lábios e demonstra que ainda precisa trabalhar mais no quadro. Porém ela suspira longamente, passa as mãos no bolso e diz:
Elisabeth- Irei trabalhar nele depois que comprar vinho e mais algumas tintas como amarelo ocre, canário, e magenta. E vou agora mesmo que o tempo está suave, daqui a duas horas estará muito caliente.
Ela começa a sair, mas antes de sair toma outro copo de água. O rádio que ouvíamos desliga e não ouvimos mais nenhum barulho. O pano desce.
FIM
|
Poeta
|
|