Sonetos :  Poeta X realidade
Poeta X realidade
Sempre levei uma vida
de história em quadrinho:
às vezes sou bandido,
às vezes sou mocinho.

Muitas vezes passo escondido,
fugindo da malvada realidade.
Ela vem com sua voracidade,
tentando destruir meus sonhos.

Mas sou um poeta destemido
e não me entrego facilmente...
Imponho um duelo diferente:

Realidade, se queres duelar comigo,
vou deixa-te de castigo,
ficando sempre ausente.

A.J. Cardiais
imagem: google
Poeta

Sonetos :  Nas fronteiras da imaginação
Nas fronteiras da imaginação
Para este mundo
eu estou morto,
enquanto vivo absorto,
astuciando de tudo.

Viajo via verso
observando as fronteiras
da imaginação...
Um crime sem salvação.

Uma voz de prisão
desperta este verso torto,
dentro de um poeta morto.

O verso é o culpado,
simplesmente por ter deixado
o poeta entrar nesta condição:

morrer para a vida.

A.J. Cardiais
imagem: google
Poeta

Sonetos :  Amor altruista
Amor altruista
Não vou mudar minha meta
para querer provar nada...
Já tracei minha caminhada
por uma poesia liberta.

Muita gente quer ver o poeta
falando só de amor.
Mas isto também é amor...
Só que um amor altruísta.

Um amor a perder de vista.
Um amor pela população,
um amor pela Nação.

Não é um amor egoísta...
É um amor socialista,
para quem pensa em união.

A.J. Cardiais
imagem: google
Poeta

Poemas :  Carregador de ilusões
Carregador de ilusões
O poeta sai pelos becos,
arrastando a poesia
das lamentações...

Sobe a escadaria
das indignações,
sonhando que um dia
dará um jeito
em suas ilusões

A.J. Cardiais
imagem: A.J. Cardiais
Poeta

Crónicas :  O poeta amador
Quem está aprendendo alguma coisa, deve ser chamado de aprendiz ou iniciante, não de amador. Amador é quem faz algo por amor. Às vezes a diferença entre amador e profissional é só porque um faz por amor e o outro faz por dinheiro. Então o amador deveria ser mais valorizado, porque tem muitos “profissionais” que trabalham sem amor nenhum à profissão. Infelizmente o que faz alguém ser chamado de “profissional” é só porque sobrevive daquilo.

Quantos escritores podem ser considerados profissionais? Poucos, não é? Uma vez eu li um escritor dizendo que o único escritor no Brasil, que vivia só de livros, era Jorge Amado. Isso naquela época, porque agora tem o Paulo Coelho e deve ter mais meia dúzia.

O que faz um escritor ser considerado profissional? É só publicar um livro? É publicar um livro, e fazer parte da Academia Brasileira de Letras?
No tempo de Drummond, Bandeira etc, quando a poesia era mais “consumida”, todos os poetas sobreviviam como cronistas de jornais ou trabalhando com outras coisas. Nunca li algo dizendo que eles sobrevivessem de literatura. Será que eles eram considerados amadores, na época?

Vender livros hoje em dia está muito difícil. Além do povo não ser muito chegado à leitura, os livros estão muito caros e o povo não tem dinheiro. Como viver de livros? Conheço alguns poetas que se esforçam para publicar um livro, e depois saem vendendo de bar em bar... Tem muita gente que compra, só por comprar. Quando chega em casa joga o livro em um canto ou fica usando para guardar contas.

Uma vez eu encontrei uma amiga, que eu sabia não ter a menor simpatia com poesia, com o livro de um poeta (conhecido meu) nas mãos. Aí eu falei: eu conheço esse poeta, nós já participamos de um grupo. Onde você comprou? Ela respondeu: eu estava em um bar com o meu namorado, aí ele chegou, perguntou os nossos nomes, escreveu no livro e: dez reais. Eu ia até perguntar se ele te conhecia, mas desisti. Então eu falei: poxa menina, deveria ter perguntado. Eu queria saber o que ele iria dizer... Depois você me empresta esse livro? Ela prontamente tirou dois recibos de dentro do livro e perguntou-me se eu queria uma revistinha que estava em minha mão. Entreguei-lhe a revistinha, ela botou os recibos dentro e entregou-me o livro dizendo: tome, fique.

Aí eu pergunto: quantas pessoas ele vendeu o livro, e fez essa mesma coisa, ou pior? Esse pelo menos veio parar nas minhas mãos, e está guardado. Mas quantos já se acabaram sem ninguém dar uma “olhadinha”? E o poeta chega em casa, achando que as tantas pessoas que compraram o livro dele, estão conhecendo o seu trabalho...
Será que vale a pena fazer isso?

A.J. Cardiais
Poeta

Crónicas :  Experimentação ou possibilidades
Não leio nada como um “estudo”... Ou talvez seja um estudo, o que eu procuro ler por curiosidade e prazer. Não sou adepto de nada, nem contra nada. Sou a favor da liberdade. Liberdade de expressão. Mas, com uma condição: procurar saber, procurar conhecer. Isso não significa fazer tal e qual “aprendeu”. Significa que sabe, conhece, mas segue o que quer seguir, o que dá prazer.

Se tudo que se aprendesse, fosse obrigado a fazer tal e qual, as coisas nunca mudariam.
Na poesia por exemplo, eu sempre enfatizo para que leiam Drummond, Bandeira, Quintana, Leminski e outros. Eu peço que leiam, não como uma “obrigação”... Leiam para ter alguma ideia; para fazer alguma comparação. Se gostarem, continuem a leitura. Não acho válido alguém ler algo “só para mostrar que sabe”, sem nenhum prazer.

Mario Quintana disse: “Já li poetas de renome universal e, mais grave ainda, de renome nacional, e que no entanto me deixaram indiferente. De quem é a culpa? De ninguém. É que não eram da minha família”. ¹

É a isto que eu estou me referindo: ler algo que lhe é indiferente, só porque foi escrito por alguém de renome...
Esse texto de Mario Quintana (Carta), quem se arvora a escrever poesia, deveria lê-lo, é ótimo.

¹ Mario Quintana
Em: Carta
Coleção Melhores Poemas
Ministério da Educação – FNDE
Pag. 90

A.J. Cardiais
Poeta

Crónicas :  Eu, um anti poeta?
Acho que eu sou um anti poeta ou não existe poeta nenhum em mim. É só um personagem, um “encosto”... sei lá. Não sei definir o que é “ser poeta”. Só acho que não é só "escrever poesias”. Deve ser muito mais do que isto. É uma filosofia de vida ou algo assim. Talvez eu esteja exigindo muito do poeta.
Quando eu tenho que participar de algum evento, que é preciso dizer qual é a minha “função”, eu digo “poeta” com tanta timidez, que até parece que estou mentindo. E quando alguém me chama de poeta, eu adoro o título, mas fico como alguém que recebeu uma armadura bem maior de que o corpo franzino.

Para mim, ser poeta é uma responsabilidade muito grande. Quando penso em Castro Alves, Gregório de Matos, Cuíca de Santo Amaro, Rodolfo Coelho Cavalcante... (isto, só na esfera da Bahia) me sinto pequenininho. Não me acho digno de ostentar o título. O que alivia o meu sentimento é ver tanta gente, só porque escreve alguns versos, se auto intitulando de poeta sem, ao menos, procurar conhecer a história dos grandes poetas; sem procurar saber alguma coisa sobre a própria poesia. Mesmo que não faça uso do que aprendeu. Eu, pelo menos, procurei e procuro saber alguma coisa sobre os poetas e sobre poesias. É esse pouco saber que me salva.

A.J. Cardiais
Poeta

Crónicas :  É preciso curiosidade
Posso até estar enganado, mas defendo uma tese: Ninguém precisa cursar uma Faculdade de Letras, para ser Poeta. Primeiro porque a faculdade não forma ninguém em poeta. Como todas as artes, ser poeta é um dom. E se for olhar na história, os nossos poetas de renome não cursaram Letras, cursaram Direito, Farmácia etc. Eu, depois de estar trilhando pelos caminhos da poesia, fui cursar Letras, pensando em dar mais “peso” à minha poesia... Só cursei quatro semestres. Vi tanta coisa, que achei que acabaria me perdendo. Depois, lendo sobre Paulo Leminski e sobre Fernando Pessoa, fiquei sabendo que eles também abandonaram a faculdade de Letras. Juro que fiquei mais aliviado. Mas não é o certo, pois uma Faculdade é muito importante. Ela sempre abre novos horizontes. Contudo a questão aqui é sobre a curiosidade. Então vamos ao que interessa: Escrevi uma crônica (Eu, Um Anti Poeta?) que deve ter mexido com os brios de muita gente. Inclusive com o meu. Vou tentar me explicar: acho que as pessoas que se "arvoram" a escrever poesia deve, pelo menos, procurar saber um pouco a história da poesia e sobre alguns poetas. Não como um pesquisador, como um curioso. Afinal, a pessoa tem que saber alguma coisa sobre o que ela está fazendo. É como se estivesse “pedindo licença” para trilhar por este caminho, e reverenciando os que já trilharam.
Agradeço ao Oswald de Andrade por ter ousado em romper com os “moldes” de fazer poesia de antigamente: O Parnasianismo e o Simbolismo. Mas ele cometeu um ato que eu acho que foi um pecado: ele desfez dos poetas antigos e queimou livros dos poetas. A mesma coisa, fizeram os Poetas Marginais: desfizeram dos poetas antigos, queimaram livros de Drummond etc. Alguns até disseram desconhecer a poesia de Drummond. Acho isso uma falta de respeito. Se alguém não concorda com o que está sendo feito, exponha seu trabalho para ver se vai agradar o povo; se vai “pegar”. Mas não precisa desfazer de ninguém.

Olhem quantas “escolas” passaram pela poesia depois do Modernismo: o próprio Oswald criou a Antropofagia, em 1928/29. Em 1956 veio o Concretismo, querendo acabar com as palavras, propondo uma poesia mais visual do que literária. Em 1959, poetas ligados ao Concretismo se desentenderam e criaram o Neoconcretismo. Este, já se preocupando mais com as palavras. Em 1962 Mario Chamie cria o Praxismo. Em 1967 Wladimir Dias Pino cria o Poema-Processo. Este também abandonando quase que completamente o uso das palavras. Eles confeccionaram um “pão poema-processo” de 2 metros, que foi comido por 5 mil pessoas, numa Feira de Arte de Recife. E finalmente em 1970 (mais ou menos), a “Geração Mimeógrafo” ou a Poesia Marginal (da qual eu sou fruto), com uma poesia mais desligada, sem compromisso com os métodos acadêmicos. O que foi bom na Poesia Marginal foi que ela não veio como uma “escola” ditando ordem, ditando conceitos. Ela veio rompendo com os já existentes e deixando a poesia livre de qualquer molde, de todas as normas.
Vou frisar mais uma vez: tudo isso que eu escrevi é fruto da minha leitura "descompromissada", da minha curiosidade. Li como um lazer, não como um pesquisador em busca de fatos para comprovar alguma coisa.

A.J. Cardiais
20.11.2011
Poeta

Sonetos :  Contaminação de palavras
A palavra é uma larva
a espera de alimentação...
Quando o poeta põe a mão,
sua mão é tomada pela palavra.

Aí o poeta lavra a palavra
quando lava a mão
cheia de larvas.
O poeta contamina tudo:

O branco do papel
a imaginação
o sol, o sal, o céu, o chão...

O poeta é só contaminação...
Contaminação de larvas
contaminação de palavras.

A.J. Cardiais
03.12.2010
Poeta

Poemas :  O fingidor
Eu estou chorando...
Apesar de não ter
uma lágrima caindo.

Eu estou sofrendo...
Apesar das pessoas
só me verem sorrindo.

Não estou fingindo...
Apesar do Pessoa *
morrer afirmando.

A.J. Cardiais
16.11.2010

*Fernando Pessoa
Em: Autopsicografia
Poeta